A ciência não é
apenas o acúmulo de informações. Também constitui uma maneira de pensar, um
modo de abordar os problemas.
(GREENE, Robert. Maestria. Trad. Afonso Celso da Cunha Serra. Rio de Janeiro:
Sextante, 2013, p.115.)
COMEÇANDO:
Já vou
começar dizendo: não é culpa sua; você faz isso porque ninguém te
ensinou/estimulou a fazer diferente. Mas isso não justifica, entretanto, você
não querer melhorar... Convido à reflexão. Melhoremos juntos. No final do texto, dou umas dicas interessantes. Vamos lá.
A CAUSA DO (SEU) PROBLEMA:
O nosso
sistema de ensino, de há muito vigente, é estúpido. Não há outra palavra, vai
essa mesma. Estúpido. Pode ser que, aqui ou ali, existam exceções – escolas,
professores e alunos diferenciados. Pode ser... Mas, como se diz, a exceção
justifica a regra. Sei que existem casos excepcionais, mas o SISTEMA é
estúpido, a mecânica geral da coisa é errada.
Qual o
motivo do chilique? Vários, mas vamos nos concentrar em um ponto específico: o
sistema de ensino não prepara o aluno para aprender/refletir. O sistema de
ensino te adestra para repetir. E antes que você, amigo pedagogo, comece a
falar da LDB e de Gilberto Freire e coisas do tipo, já digo que eu não estou tratando
do mundo ideal-teórico-desejado, onde esses dois personagens se encontram.
Estou a falar, ao invés, da linha de frente do sistema de ensino: da boa e
velha sala de aula do mundo real. Digamos que estou a falar do chão de fábrica.
Das coisas como efetivamente são, não de como queríamos que fossem. Nesse
sistema, o nosso aluno é ensinado a repetir, não a construir. Esse o ponto de
partida deste texto.
Isso
daria muito pano pra manga, mas não vou me delongar aqui. Por ora, basta pensar
– e adoro essa idéia – que o nosso sistema de ensino, assim como a pirâmide de
Kelsen, está estruturado de cabeça para baixo: a ponta do sistema (provas de
vestibular ou congêneres de acesso ao ensino superior) determinam o
funcionamento das instâncias básicas. Nosso aluno, modo geral, não é formado
para pensar, refletir, decidir, sentir (sim! sentir!), avaliar, entender e
aplicar. Nosso aluno é formado para reproduzir na proveca do vestibuleco aquilo
que lhe foi entulhado pela decoreba – mais ou menos evidente, mas sempre
presente – ao longo dos anos.
(Preciso
de um parêntese para dizer que, no ensino do Direito no Brasil, encontramos
uma realidade muito peculiar brasileira, que é
a deformação do ensino jurídico pela força que a indústria dos concursos
ganhou no meio social. Como as carreiras de Estado costumam atrair o interesse
de muitos, e como o acesso aos cargos se dá por concurso, e como as matérias
são compostas por conteúdo jurídico, na escala de valores/preocupações do aluno-médio a preocupação em “saber responder” o V ou F do concurso se tornou
preponderante sobre o conhecimento aprofundado das teorias. Fecho parênteses. Como
costumamos dizer, o maior doutrinador de Direito, hoje, no Brasil, é o carinha
anônimo, formado sei lá aonde, que elabora a prova do CESP.)
Bem...
Se seria possível um sistema diferente, e como ele seria, já é uma outra
discussão. Não tenho resposta para tal questão e não vou derivar o argumento
para essa linha. Porém, o que quero dizer, até aqui, em essência, é que nosso
aluno padrão chega ao ensino superior com alto grau de capacidade... Capacidade
de reprodução acrítica!
Vou
repetir, querido aluno, a CULPA NÃO É SUA, te (de)formaram assim, você é assim
porque o sistema operou sobre você, desde que você nasceu, para que você
ficasse assim... Mas atenção! Você não é culpado pelo problema, mas é
RESPONSÁVEL PELA SOLUÇÃO! Continuemos.
O PROBLEMA CHEGA AO ENSINO SUPERIOR:
Quando
o aluno chega à faculdade, ele repete o padrão que foi a ele ensinado durante
toda sua vida – copia, decora e repete. De verdade, diz pra mim se não é a cara
do sistema de ensino essa frase? Então o aluno faz exatamente aquilo que tem
competência – aquilo para que foi treinado. Ele senta e copia. E aí estou
chegando aonde quero.
Qual o
problema em copiar o que o professor fala? Não haveria nenhum problema, querido
aluno, se você soubesse fazer anotações de modo correto.
E qual
é o modo correto? Permita-me falar primeiro do modo errado, ok?
Tá
bem... Me diz qual é o modo errado... O MODO ERRADO de se fazer anotações é
querer registrar rigorosamente tudo que foi dito, palavra por palavra, letra
por letra, até os espirros e gaguejos que o professor fala. Esse erro é fruto
do sistema defeituoso que mencionei. Foi isso que o aluno aprendeu a fazer até
hoje.
E por
que isso é um erro? Porque isso demonstra que o aluno está se ocupando da coisa
errada! Que coisa errada? Quando o aluno adota essa prática,
ele demonstra que sua energia está voltada para a mera retenção de informações,
ou seja, memorizar o conteúdo, ou seja, a parte decoreba do processo do
aprendizado – entende-se isso facilmente: ele anota cada vírgula e cada letra
porque ele sabe que, sendo ele um ser humano, ele irá esquecer 80% do que foi
dito em alguns minutos. A anotação para ele, então, funciona como um HD externo
– ele anota para reter no papel aquilo que ele sabe que não será
retido na memória.
Mas por
que mesmo que isso é um erro? Porque, ao agir dessa forma, deixa de aproveitar
aquilo de ESPECÍFICO que a sala de aula tem para te oferecer – ou seja, a COMPREENSÃO
de como se opera/trabalha/pensa/processa aquela informação. Esse é o ponto,
entende?
Quase
entendendo... Mas não é importante reter informações? Não é importante lembrar
de um conjunto de regras básicas (pensando no estudante de Direito)? Sim!
Claro! A retenção do conteúdo é parte essencial do aprendizado. PORÉM, quero que
você perceba que isso pode ser alcançado sem a sala de aula – por meio de
livros, estudo direto da lei etc. etc. etc. Em outras palavras, se você está na faculdade, espera-se que você saiba ler. Se você sabe ler, você
não precisa do professor para saber o que está escrito no art. 1º do Código. O
ganho que o professor tem a te oferecer é te ajudar a enxergar como você pode
trabalhar com o art. 1º. É isso.
UM OUTRO CAMINHO:
E se eu
não fizer anotações desse tipo, vou fazer o quê em sala de aula?
(Somos tão alopradamente condicionados pelo sistema que nos deformou que não
conseguimos sequer ver uma alternativa de comportamento diverso...) Então, durante
as aulas, debates, palestras seu ESFORÇO DEVE SER VOLTADO PARA COMPREENDER (a) AS
INFORMAÇÕES CENTRAIS e (b) A TÉCNICA DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS que te está
sendo demonstrada. Toda aula, de todo professor, bem ou mal, de modo mais claro
ou menos claro, mas toda aula será composta por essa combinação: informação
mais aplicação.
Então,
por exemplo, se o professor começa a explicar o conceito de contrato, o aluno
típico já abaixa a cabeça, aciona o motorzinho na mão e se concentra em repetir
no papel aquilo que o professor está dizendo oralmente. Ao voltar sua atenção
para a atividade da cópia, ele vê reduzida em muito seu potencial de
compreensão.
Como
assim? Quando você está preocupado em registrar no seu caderno cada sílaba
exata, na sequência exata que o professor pronunciou, você diminui sua força de
percepção daquilo que é que central e relevante.
Sabe o
que é mais engraçado? É que o aluno está preocupado em anotar a sequência exata
de palavras que o professor disse, mas o próprio professor não tem essa
memória! O professor tem a compreensão do tema, mas a explicação é feita com palavras
e sequências e rotinas diferentes, que mudam a cada oportunidade. O conteúdo é
o mesmo, mas a forma de externalizá-lo muda. Não temos um conceito decorado do
que seja o contrato, por exemplo. Temos a compreensão do que ele é. Se tivermos
que explicar em momentos diferentes, exporemos a mesma idéia, mas com palavras
diferentes.
Um fato
comum de sala me ocorre agora: quando o aluno pede para o professor repetir, o
professor repete as mesmas idéias, mas, obviamente, não sendo ele um gravador,
repete numa sequência ligeiramente alterada, mantendo o conteúdo, mas usando
uma expressão diferente aqui ou ali. Aí o aluno-copista, que está preocupado em
fazer aquele “registro fiel” da primeira frase, fica indignado! "Ahhh, professor... Vou rasurar o meu caderno..." Seria um cômico,
se não fosse trágico – a tragédia está em ser esse o evidente sintoma do
problema que estou a apontar.
Salvo
algumas exceções mais raras, no âmbito da graduação, rigorosamente todo o
conteúdo que o professor expõe já está nos livros e, no caso do Direito, nos Códigos.
Os professores te passam informações que já estão “previamente anotadas”, não
sendo necessário, a rigor, registrá-las, pois elas não serão perdidas, já que estão nos livros e leis – inclusive, sempre se recomenda que
você faça a leitura do material de estudo ANTES da aula, ampliando seu
aproveitamento do encontro de sala.
Então,
como proceder diante de uma aula/exposição? Sua concentração deve estar voltada
para COMPREENDER as idéias centrais, bem como na FORMA COMO O PROFESSOR USA A
INFORMAÇÃO. Voltando ao nosso exemplo, esteja concentrando em entender a idéia
de contrato, tendo clareza do que é central, de quais são as “chaves” de compreensão.
Também
concentre sua atenção na forma como os exemplos são expostos - sobretudo exemplos que trabalham casos. Ou seja, atente para a SEQUÊNCIA DE RACIOCÍNIO DA APLICAÇÃO do conceito em determinadas situações – reais ou imaginadas para fins didáticos.
EXPERIMENTE FAZER DIFERENTE:
E a
forma correta? Você disse que tinha uma forma correta? Sim, eu disse. A forma
correta é aquela que registra, de modo sintético, os pontos-chave da
explicação, os quais funcionarão posteriormente, nos momentos de sua revisão,
como ganchos de memória para o conteúdo debatido.
A boa
anotação não é aquela que registra literalmente cada sílaba dita, mas a que
registra apenas a sequência das idéias. Como quem anota um roteiro – usando novamente
o exemplo de antes, poderíamos imaginar a seguinte anotação:
·
Tema
da aula: contrato.
·
Conceito
de contrato: consentimento;
·
Diferença:
contrato x instrumento;
·
Formação:
proposta mais aceitação;
·
Princípio
da boa-fé: boa-fé objetiva x subjetiva;
·
Princípio
da função social;
·
Princípio
da equivalência material;
·
Deveres
anexos;
·
Contratos
atípicos – permissão;
·
Pacta corvina – proibição.
Essa
anotação fictícia, que uso aqui como exemplo, é o esquema de 3 a 4 horas de
aula sobre contratos. Então! De 3 a 4 horas esquematizadas em algumas linhas! É
isso! E durante o resto do tempo, descontados os segundos que levei para
escrever essas linhas, posso estar concentrado em tentar perceber qual a idéia
central de cada conceito, como o professor usou os conceitos em exemplos
construídos em sala, posso eventualmente lembrar de alguma situação que tenha
relação com o tema e por aí vamos...
Você pode até anotar o gatilho de memória para o exemplo dado! Não é registrar toda a história, mas apenas a palavra-chave que te fará dela recordar. Exemplo: o professor poderia ter contado sobre ocaso dos agricultores de tomate que saíram vitoriosos numa lide, usando como ferramenta de debate no processo o princípio da boa-fé objetiva (caso real, que simplificamos para usar de exemplo em sala). Você poderia anotar:
· Caso dos agricultores - venda frustrada - boa-fé objetiva;
Pergunta
do angustiado: mas se eu esquecer o exato conceito de contrato? Recupere no
livro!!! Se eu esquecer o exato conceito de pacta
corvina? Recupere no livro!!! Já está anotado lá!!! Se você usou bem sua
atenção na sala de aula, você terá COMPREENDIDO o que essas figuras são, de
modo que sua leitura posterior, recuperando a memória das informações, será
EXTREMAMENTE FACILITADA.
Mas e
as exatas palavras do professor? As exatas palavras não importam, importam as
idéias centrais!!! Se ele disse A-C-D-B, não importará se você disser B-C-A-D,
desde que tenha trazido as idéias-chave para o tratamento da questão.
Entendeu?
Ou quer que eu repita?
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