Antes do Código atual, de 2002, porém, embora muito usado, esse contrato não era objeto de regra própria, de modo que, diante da lacuna legislativa, a teoria e a construção jurisprudencial foram determinantes para solucionar algumas questões relevantes. Uma dessas questões era a seguinte: caso o promitente-vendedor desrespeite o contrato de promessa e não finalize a venda definitiva, mesmo após o integral pagamento do preço, poderia o promitente-comprador exigir judicialmente a transferência forçada (adjudicação compulsória) do imóvel para seu nome?
Num primeiro momento, a teoria entendeu que, sendo a promessa de compra e venda um instrumento que gera direitos pessoais, não reais, não poderia o promitente-comprador prejudicado obter a adjudicação compulsória, mas tão somente postular por perdas e danos - o que nem sempre faz justiça do ponto de vista de quem está a adquirir o bem.
Já num segundo momento, a teoria avançou para entender que, se não houvesse prejuízo de terceiros, o adquirente poderia, sim, obter a adjudicação compulsória do imóvel. Porém, para isso, haveria de ter feito o registro do contrato de promessa na matrícula do imóvel a ser adquirido.
Num terceiro momento, a jurisprudência verificou que a necessidade de registro muitas vezes não fazia justiça no caso concreto, sobretudo no mundo atual, de grandes empreendimentos imobiliários, com empresas incorporadoras levantando edifícios de dezenas de centenas de unidades. Assim, o STJ editou, no ano 2000, o verbete 239 de sua súmula de jurisprudência, que diz que:
O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.
Porém, com a edição do Código Civil, em 2002, o legislador supriu a lacuna legislativa que havia sobre a matéria, tratando do contrato preliminar, regulado no livro do direito das obrigações, na parte que trata da teoria geral dos contratos (arts. 462-466), e regulando especificamente a promessa de compra e venda de bem imóvel que, pela sua particular importância, foi tratada no livro do direito das coisas, onde o legislador criou uma nova figura de direito real - o direito real de aquisição, regido pelo Código Civil, em seus artigos 1.417 e 1.418, que dizem:
Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
A partir de então, pensamos que não mais se sustenta o enunciado 239 da súmula de jurisprudência do STJ, haja vista que não mais se configura a omissão legislativa que tal enunciado, anterior ao Código Civil vigente, veio preencher. Diante da opção expressa do legislador de 2002, o verbete citado deve ser cancelado ou revisto, sob pena de se ter, então, um ato legislativo do Poder Judiciário - o que não se admite pela separação dos poderes prevista constitucionalmente.
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